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22 junho 2025

Grande vazamento de senhas


O maior vazamento de dados da história expôs mais de 16 bilhões de senhas e logins, segundo a Cybernews. O material foi compilado a partir de 30 bases de dados diferentes, muitas delas recentes, e inclui credenciais obtidas principalmente por meio de golpes de phishing, infostealers (malwares que roubam dados) e ataques de ransomware. Cerca de 3,5 bilhões dos registros seriam de usuários de língua portuguesa. As informações ficaram disponíveis por pouco tempo, mas foram rapidamente copiadas e estão sendo comercializadas na dark web. Empresas como Apple, Google e Meta foram questionadas, mas não confirmaram oficialmente o incidente. Especialistas alertam para os riscos de sequestro de contas, fraudes, roubo de identidade e ataques a sistemas bancários e governamentais. As recomendações incluem trocar senhas, usar gerenciadores de senhas, ativar autenticação de dois fatores e manter sistemas atualizados. O caso revela a gravidade dos riscos digitais e a falta de percepção pública sobre o problema. 

Fonte: aqui 

Sobre a obra de Jensen

Um texto de Fama e French sobre a obra do falecido Jensen 

 Grande parte da pesquisa de Mike Jensen é fundamental, incluindo suas primeiras publicações, que se concentram na precificação empírica de ativos. Por exemplo, o alfa de Jensen, que ele desenvolve em Jensen (1968 e 1969) para avaliar gestores de fundos mútuos, é a base para a maioria das métricas de desempenho de investimentos. Da mesma forma, em Fama et al. (1969), Jensen e seus coautores apresentam o primeiro estudo de evento. A partir daí, os estudos de evento passam a desempenhar um papel central nas pesquisas em finanças, contabilidade e direito. Por fim, Black, Jensen e Scholes (1972) desenvolvem uma percepção chave sobre a importância da interdependência dos erros amostrais na precisão dos testes de precificação de ativos.

21 junho 2025

Os efeitos da guerra na Gazprom

A Gazprom, uma das grandes empresas russas, está enfrentando uma grave crise em razão da guerra com a Ucrânia. Os governos da Europa deixaram de comprar o produto da empresa e isso representava 40% da sua receita. Além disso, a explosão dos gasodutos NordStream contribuiu para a redução. 

Os dados indicam que em 2023 a empresa teve prejuízo, o primeiro desde 1999, de 583 bilhões de rublos ou algo em torno de 7 bilhões de dólares. Os números de 2024 são divergentes, existindo estimativa de prejuízo do dobro do ano anterior e também estimativa de lucro, no mesmo valor. 

A empresa tenta reduzir custos, cortando cargos administrativos e reduzindo despesas administrativas. Mas provavelmente somente uma paz pode contribuir para um período de bonança para a empresa. 

Contabilidade e a idade medieval europeia

A escrituração contábil durante a Idade Média evoluiu em várias direções distintas. O desenvolvimento, no norte da Itália, das sociedades de risco e do comércio ultramarino levou ao surgimento do sistema de partidas dobradas que utilizamos hoje. É tentador fazer da história da contabilidade apenas a história da escrituração por partidas dobradas, ignorando rapidamente os mil anos entre a queda de Roma e a publicação da Summa de Arithmetica de Luca Pacioli, em 1494.

Por estarem fora da linha de eventos que levou diretamente às partidas dobradas, os detalhes das práticas medievais fora da Itália tendem a ser negligenciados ou tratados apenas como curiosidade histórica.

Em contraste com os procedimentos contábeis codificados do Império Romano, os registros medievais eram geralmente locais e centrados em uma série de instituições especializadas. Embora seja difícil isolar as influências romanas, em ambos os períodos os registros eram mantidos, principalmente, porque os empregadores precisavam monitorar seus subordinados que atuavam como seus agentes.

O paralelo mais próximo do método romano de escrituração está na contabilidade de recebimentos e pagamentos da Igreja Católica, que, por centenas de anos, cobrava e arrecadava impostos em toda a Europa. Já no século VI, diáconos eram designados para administrar as propriedades da Igreja e prestar contas de suas receitas. Agentes do tesouro papal estavam localizados nas províncias e tinham a responsabilidade de enviar os recebimentos para Roma.

O valor da contabilidade como ferramenta para a gestão sistemática de propriedades foi reconhecido desde cedo. No século IX, Carlos Magno elaborou o Capitulare de Villis, uma série de instruções detalhadas para seus administradores sobre a supervisão das terras reais e o envio de relatórios ao soberano. Embora os métodos de cálculo fossem primitivos e os períodos contábeis irregulares, Jack (1966) observou que “Carlos Magno enfatizava a necessidade de organização, de agrupar temas semelhantes sob um único título e de revisar de forma ordenada as prováveis fontes de receita”. Fazia-se um inventário anual das propriedades e dos bens móveis do rei. Receitas e despesas eram registradas em livros separados, e qualquer saldo era enviado ao monarca.

Na Inglaterra pré-normanda, a alfabetização era tão rara — até mesmo entre a nobreza — que um sistema escrito de contabilidade dificilmente justificaria seus custos. Até o século XI, os dados financeiros eram quase sempre comunicados e verificados oralmente, sendo os documentos escritos apenas complementares à palavra falada, que era considerada mais importante. Naquela época, a introdução do ábaco e outras melhorias nas técnicas aritméticas coincidiu com um renascimento do interesse pela linguagem escrita. Um sistema de registros escritos foi, então, gradualmente formalizando uma tradição contábil que até então era essencialmente oral.

Os métodos contábeis medievais ingleses merecem atenção por diversas razões. Os primeiros registros fiscais do governo e os livros de contas senhoriais estão entre os documentos mais antigos preservados na língua inglesa, e as abordagens adotadas para resolver problemas nessas áreas possuem paralelos evidentes na prática moderna. A contabilidade de agência da Idade Média lançou as bases para os atuais princípios de stewardship (responsabilidade fiduciária) e conservadorismo. Ela também ajudou a criar as condições para o rápido avanço das tecnologias contábeis ocorrido durante a Renascença.

Além disso, a ampla disseminação e durabilidade desses sistemas sugerem que a contabilidade por partidas dobradas não é a única forma eficiente de organizar dados financeiros — e que, em muitos casos, métodos mais simples podem produzir resultados igualmente úteis.

A sociedade feudal é frequentemente representada como uma pirâmide em múltiplos níveis, na qual os indivíduos de cada nível inferior recebiam certos direitos em troca do cumprimento de determinados deveres. Esse sistema exigia diversas delegações de autoridade e a transferência de direitos sobre terras dos proprietários nominais para os possuidores e usuários efetivos. O problema contábil característico desse contexto era o da comunicação e verificação vertical entre o principal e seu agente.

Nas finanças reais inglesas, isso levou ao sistema de proffer, utilizado para registrar e verificar a arrecadação de impostos, enquanto na contabilidade dos feudos deu origem ao demonstrativo de charge and discharge, preparado pelo administrador da propriedade (steward) em nome de seu senhor.

Até o final da Idade Média, o trabalho humano era o fator produtivo mais dinâmico, e os sistemas sociais feudais eram projetados para manter a mão de obra fixa na terra. Os manors — as propriedades da nobreza — eram as fazendas e oficinas da Grã-Bretanha medieval. A contabilidade senhorial na Inglaterra descrevia os recebimentos e pagamentos de uma entidade econômica autossuficiente, e os resultados de suas transações com terceiros eram classificados como “externos” nas contas.

Outra característica da vida senhorial era a administração por procuração. O senhor feudal, como um duque ou conde, frequentemente dependia, para seu sustento, da produtividade de grandes extensões de terra e dos esforços de centenas de pessoas que ele não podia supervisionar pessoalmente. A gestão do dia a dia ficava, normalmente, a cargo de uma hierarquia de funcionários e chefes de departamento. O incentivo do senhor para manter registros contábeis surgia de sua necessidade de fiscalizar a integridade e a confiabilidade de seus administradores, evitar perdas e furtos, e, de modo geral, estimular a eficiência. Do ponto de vista do steward, os registros contábeis serviam como prova de que ele havia cumprido suas obrigações de forma honesta e adequada.

A autossuficiência dos feudos e a relação de agência são fundamentais para compreender as diferenças entre os registros patrimoniais da época e os registros contábeis atuais. A independência econômica e a ausência de necessidade de prestar contas a terceiros significavam que pouco do que hoje chamamos de contabilidade financeira era necessário. As vendas a crédito eram raras. Os ativos eram inventariados, mas balanços patrimoniais dificilmente eram elaborados. As ferramentas do senhor podiam ser contabilizadas juntamente com os bens pessoais de seus arrendatários, e os valores monetários, às vezes, eram combinados com quantidades físicas de bens nas demonstrações de ativos do feudo. Não havia uma distinção clara entre despesas de capital e despesas operacionais — o custo de um cavalo era registrado da mesma forma que o custo do feno que ele consumia.

As despesas podiam ser alocadas em detalhes entre várias atividades, de modo a demonstrar os resultados de cada uma, mas o lucro ou prejuízo geral normalmente tinha pouca relevância. Por vezes, a narrativa das contas era interrompida para incluir estimativas sobre o que poderia ter sido obtido caso uma decisão diferente tivesse sido tomada.

Os administradores senhoriais mantinham registros não em benefício da entidade econômica, como se faz hoje, mas sim para sua própria proteção. Em grandes propriedades, um surveyor (fiscal de terras) organizava um livro contendo os aluguéis de terras e taxas devidas, que era utilizado pelo receiver-general, responsável pela arrecadação efetiva dessas receitas e pelo seu registro por fontes. Outros funcionários pagavam e controlavam salários e despesas. Auditores examinavam periodicamente e resumiam todas essas contas, que eram essencialmente registros dos indivíduos envolvidos, e não do feudo em si. Como seu objetivo era apenas demonstrar que as obrigações haviam sido devidamente cumpridas, havia uma tendência natural para que cada administrador registrasse apenas os itens pelos quais era responsável, apresentando cada tipo de receita em contraposição aos respectivos pagamentos.

Poderia haver ainda mais diversidade na escrituração medieval do que, de fato, existiu. As razões modernas para a consistência e a comparabilidade contábil praticamente não existiam. No entanto, parece que o ambiente feudal, como qualquer outro, favorecia certas técnicas. Governos municipais, propriedades monásticas e laicas, residências e guildas de ofício — ou worshipful companies — compartilhavam uma tradição de escrituração no modelo de charge and discharge e auditorias de prestação de contas. Todos os tipos de registros eram sincronizados com os ciclos agrícolas, sendo o dia de Michaelmas (29 de setembro) a data que marcava a colheita e o encerramento do ano contábil natural.

A escrituração de entrada simples no Japão feudal seguia um padrão semelhante de registros descentralizados, uso do ábaco para numeração visual, ênfase no controle e responsabilização pessoal dos agentes encarregados da contabilidade.

A autossuficiência do feudo impôs limites ao seu desenvolvimento como instituição. A Inglaterra, que havia sido isolada geograficamente do comércio com o Oriente Próximo durante a Renascença, encontrou-se em uma posição mais favorável após a descoberta da América. No século XVII, as cidades começaram a substituir os feudos como centros da vida econômica, e os fabricantes independentes passaram a competir com os artesãos rigidamente regulamentados pelas guildas. A expansão do comércio ultramarino criou novos mercados e fontes de suprimento. O foco passou da administração dos ativos senhoriais para a proteção dos investidores corporativos e para questões relativas à apuração de resultados e ao pagamento de dividendos.

A contabilidade de agência permaneceu, mas começou a assumir a forma sofisticada que já havia se desenvolvido, séculos antes, no norte da Itália, onde a acumulação de capital e as longas distâncias comerciais favoreciam operações por filiais, arranjos de crédito e transações por consignação.

Não se pode culpar os contadores senhoriais por não produzirem dados de que não precisavam. O executivo típico da Idade Média praticamente não escrevia e lia muito pouco. As contas do Exchequer (Tesouro Real) e dos feudos eram mantidas, normalmente, sob o pressuposto de que nem o rei nem o barão jamais as leriam. Assim, a contabilidade tendia a se encerrar no ponto em que o chefe de cada departamento dispunha de informação suficiente para seu próprio uso.

Homens desse contexto dificilmente desenvolveriam um método contábil que colocasse ativos e patrimônios líquidos em oposição, porque não possuíam um conceito real de capital. O feudo era o seu capital. A terra raramente era comprada ou vendida; eles só podiam atribuir-lhe valor com base em algum múltiplo da produção líquida anual. Com a produção tão interligada ao consumo, havia pouco incentivo para determinar a renda total. Tampouco havia necessidade de uma contabilidade de custos sistemática, pois a maioria dos feudos seguia um padrão repetitivo e pouco variável de receitas e despesas.

No entanto, nas áreas de controle interno e auditoria, a prática senhorial estava muito à frente do “Método de Veneza” de Pacioli. Demonstrava como registros feitos principalmente para apurar um balanço anual podiam ser adaptados para ajudar na gestão diária dos negócios. A doutrina do conservadorismo era uma forma de autoproteção para o administrador do feudo (steward) diante da auditoria; essa mesma tendência à subavaliação é central na contabilidade corporativa moderna. Inventariantes e administradores de bens continuam utilizando o demonstrativo de charge and discharge para prestar contas da gestão de ativos sob sua responsabilidade fiduciária.

Até mesmo o sistema moderno de pesos e medidas — com todas as suas imperfeições — tem origem naquela época, quando uma jarda correspondia à distância do nariz do rei até a ponta de seu braço estendido. Se muitas coisas mudaram, há ainda semelhanças suficientes que fazem com que nossa herança contábil da Idade Média seja rica em formas, técnicas e ideias.


 

Michael Chatfield - The History of Accounting

Preferi não usar o termo "grandes civilizações" aqui, pois o verbete trata de várias situações, especialmente Inglaterra e, em menor quantidade, o Japão. Mas é interessante a posição do autor, que destaca a importância da contabilidade medieval e o fato de cumprir seu papel.  Imagem: aqui

Grandes civilizações e a contabilidade: os arábes

 


O sistema de numeração arábico se originou na Índia. O sistema moderno de números arábicos, incluindo o zero, começou a ser utilizado no mundo muçulmano a partir do século IX. Eles aparecem em manuscritos europeus datados de 976 e 1143. No Liber Abaci (1202), Leonardo de Pisa demonstrou a superioridade dos números arábicos ao apresentar registros nos quais os numerais romanos apareciam no texto, contrastando com os números arábicos organizados em colunas à direita.

Em apenas uma geração, os números arábicos passaram a ser amplamente utilizados pelos comerciantes italianos. A contabilidade por partidas dobradas surgiu não mais tarde do que no século XIII, mas os numerais romanos continuaram sendo utilizados nos registros contábeis quase sempre até o século XVI. Portanto, a ampla adoção dos números arábicos não foi uma condição prévia para o desenvolvimento da contabilidade por partidas dobradas.

No entanto, as características aditivas dos números arábicos proporcionaram uma vantagem para o formato bilateral das contas, no qual recebimentos e pagamentos eram colocados em duas colunas lado a lado. G.E.M. de Ste. Croix argumenta que essa separação em colunas pode ter dado origem à noção de débito e crédito, facilitando, assim, o surgimento da contabilidade por partidas dobradas.

Michael Chatfield no verbete de The History of Accounting 

Veja também a discussão sobre a importância dos números na série sobre Roma. Figura daqui 

Grandes Civilizações e a Contabilidade: Peru

Peru 


O cordão com nós pode ser o dispositivo contábil mais antigo do mundo. Lyle Jacobsen descreveu seu uso na pré-história do Havaí, nas Ilhas Marquesas e na China antiga, onde o uso de cordões com nós para registros aparentemente antecedeu o surgimento da linguagem escrita, por volta de 3300 a.C.

O uso mais bem documentado da numeração por cordões com nós ocorreu no Peru. O quipu foi utilizado pelos incas, a partir de aproximadamente 1200 d.C., como um dispositivo de contagem e registro. Consistia em um cordão de algodão ou lã, com comprimento que variava de alguns centímetros a mais de um metro, ao qual eram presos um ou mais cordões secundários com nós. As cores desses cordões muitas vezes indicavam os tipos de itens registrados, enquanto o tamanho de cada nó e sua distância em relação ao cordão principal representavam números específicos, baseados em um sistema decimal. Um único nó na extremidade inferior do cordão representava um; dois nós na mesma posição indicavam dois; um nó mais próximo do cordão principal representava dez; um nó ainda mais próximo indicava cem, e assim sucessivamente. Foram encontrados quipus com nós que registravam centenas de milhares de itens.

Os homens especializados na confecção e leitura dos quipus eram chamados de quipucamayocs. Eles acumulavam as funções de escribas, contadores, estatísticos e historiadores. Assim como os recenseadores modernos, eles contavam os habitantes de cada aldeia, registravam nascimentos e mortes e especificavam o número de homens disponíveis para o serviço militar. Também ajudavam na alocação de recursos dentro do império, registrando impostos devidos, receitas do governo, inventários dos armazéns e até as quantidades de matérias-primas distribuídas aos tecelões e os volumes de tecidos produzidos. Todas essas informações eram registradas nos quipus e enviadas, por mensageiros, à capital, Cuzco.

O Império Inca era um paradoxo: uma economia altamente centralizada e planejada que funcionava sem linguagem escrita ou moeda cunhada. O quipu e os quipucamayocs eram elementos centrais de sua administração.

Michael Chatfield para The History of Accounting

Já postamos sobre o assunto aqui e aqui. Um verbete bem extenso sobre os quipus pode ser encontrado aqui

Grandes civilizações e a Contabilidade: Roma

Roma (509 a.C. – 476 d.C.)

A cidade de Roma foi o centro da República Romana (509–27 a.C.) e do Império Romano (27 a.C.–476 d.C.). Após derrotar e destruir Cartago em 146 a.C., a República Romana passou a controlar o Mediterrâneo, abrangendo desde o Norte da África, Síria, Macedônia, Grécia até o Egito. Figuras notáveis desse período foram Mário, Sula, Pompeu, Cícero e Júlio César. O primeiro imperador foi César Augusto, em 27 a.C.; outros imperadores de destaque nos primeiros 200 anos foram Trajano, Adriano, Antonino Pio e Marco Aurélio. Ao final do segundo século, o Império Romano se estendia pelas regiões do Reno, Danúbio, Ásia Menor, Síria, Palestina, Egito, África, Espanha, França e Grã-Bretanha. Havia 43 províncias a serem administradas, todas conectadas por um complexo sistema de estradas. Aquedutos forneciam água — muitos dos quais ainda existem hoje. O cristianismo tornou-se a religião oficial do império em 313, sob Constantino I. Em 395, o império foi dividido em duas partes: o Império Romano do Oriente, governado em Constantinopla, e o Império Romano do Ocidente, governado em Roma. Em 410, Roma foi saqueada, e em 476 o chefe germânico Odoacro depôs o último imperador do Império Romano do Ocidente. O Império Romano do Oriente continuou até 1453, quando Constantinopla caiu. Roma possuía uma língua altamente desenvolvida e versátil, o latim, e seus habitantes escreviam com escrita cursiva em papiro. Roma também contava com um excelente sistema jurídico e utilizava a moeda da Grécia como sua moeda internacional. A paz romana vigorou por muitos anos.


O comércio altamente desenvolvido de Roma foi descrito por Herbermann (1880). Os banqueiros eram considerados com grande respeito e mantinham correspondentes em várias partes do império. Formavam-se companhias para arrecadação das receitas públicas. O empréstimo de dinheiro a altas taxas de juros era bastante comum. Os banqueiros romanos estavam sob controle do Estado; a lei exigia que mantivessem livros contábeis para servirem como prova legal em tribunal, além de determinar que esses livros estivessem abertos à inspeção dos oficiais da cidade.

Littleton (1933) considerou que havia sete fatores necessários para a prática da escrituração contábil por partidas dobradas: (1) propriedade privada, (2) capital, (3) comércio, (4) crédito, (5) escrita, (6) dinheiro e (7) aritmética. Littleton, renomado historiador e teórico da contabilidade da Universidade de Illinois, acreditava que a complexidade da aritmética — agravada pelo uso dos numerais romanos — e a ausência da noção de capital produtivo tornavam improvável que a escrituração por partidas dobradas existisse em Roma. Os registros das famílias romanas eram pouco mais do que anotações de recebimentos e pagamentos.

Littleton escreveu que o equilíbrio e a dualidade precisariam ser adicionados ao elemento de propriedade comercial antes que a contabilidade por partidas dobradas pudesse ser implementada. Como o comércio era visto como indigno para um patrício romano — trazendo, inclusive, implicações negativas para seus direitos políticos como cidadão —, é provável que apenas escravos instruídos cuidassem dos negócios e dos registros, utilizando um sistema de contas baseado na lógica de “entrada e saída” (charge-discharge).

O desenvolvimento avançado do direito e do sistema bancário romano certamente teve um papel significativo na manutenção dos registros. Littleton acreditava que os bancos romanos, bem desenvolvidos, poderiam ter levado naturalmente a um sistema autossuficiente de lançamentos duplos em contas bilaterais. Contudo, é questionável se esse conhecimento sobreviveu no sistema bancário durante os longos Séculos Escuros (476–1000 d.C.), que antecederam a retomada do comércio nas cidades-estado italianas.

O fascínio pela contabilidade por partidas dobradas e pelos registros antigos também influenciou outros estudiosos da contabilidade, além de Littleton.

Kats (1929, 1930), que tinha a vantagem de ser fluente em diferentes idiomas, trabalhou com os escritos de Fabio Besta (em italiano), Rudolph Beigel (em alemão) e Raymond de Roover (em francês). Em um artigo de 1930, Kats escreveu que não encontrou valores monetários associados aos registros de mercadorias em Roma, mas que valores em dinheiro eram registrados para caixa, contas a receber e contas a pagar. Ele também destacou os seguintes registros de uma família romana abastada: adversaria (livro rascunho ou livro diário provisório); codex accepti et expensi (livro-caixa); codex rationum mortalium (um razão contendo contas pessoais); e codex rationum domesticarum (registros apenas de quantidades).

Em um artigo de 1929, Kats concluiu que a contabilidade por partidas dobradas surgiu devido à relação entre escravo e senhor na economia romana: “A contabilidade por partidas dobradas começou quando, pela primeira vez, os créditos do senhor e as obrigações do devedor foram balanceados entre si nos livros de um escravo romano.”

Peragallo (1938) destacou a continuidade da cultura romana durante toda a Idade Média, argumentando que, como a propriedade privada não desapareceu, o sistema contábil romano permaneceu. Peragallo acreditava que a contabilidade por partidas dobradas poderia ter estado presente de forma embrionária no sistema contábil romano.

Por outro lado, De Ste. Croix (1956) foi bastante enfático ao afirmar que os romanos não utilizavam partidas dobradas. Ele defendia que o sistema econômico romano não havia se desenvolvido a ponto de exigir esse tipo de contabilidade, além de considerar que os numerais romanos eram inadequados para esse fim, uma vez que não eram organizados em colunas. De Ste. Croix argumentava que a contabilidade na Antiguidade existia sobretudo para expor perdas causadas por fraudes ou ineficiências dos servos e outros agentes do proprietário. No entanto, ele relatou a anomalia de uma conta bilateral encontrada em Karanis, datada de 191–192 d.C., na qual lançamentos no formato atual de partidas dobradas parecem ter ocorrido.

De Ste. Croix também apresentou o exemplo do uso, por Columela — autor de um tratado agrícola de 12 livros, De Re Rustica, por volta de 60 d.C. —, de uma estimativa conservadora dos lucros provenientes do cultivo de vinhas. Além disso, escreveu que o famoso orador e advogado romano Cícero mencionou, em um julgamento, os registros domésticos de uma família rica. Marcus Porcius Cato (234–149 a.C.), em seu tratado sobre agricultura De Agri Cultura, recomendava que o proprietário rural revisasse os registros de caixa e os diversos inventários sempre que visitasse sua fazenda, além de conferir frequentemente as contas do escravo administrador, como também observado por De Ste. Croix.

Most (1979) questionou algumas das premissas de De Ste. Croix. Most considerava que o sistema econômico romano era altamente desenvolvido e argumentava que a ausência de colunas para os números não tornava impossível a prática da contabilidade por partidas dobradas. Ele também fez referência a uma obra alemã de B.G. Niebuhr, que estudou fragmentos da oração Pro Fonteio de Cícero, preservados na Biblioteca do Vaticano, e concluiu que esses documentos sugeriam a existência de partidas dobradas.

A controvérsia sobre as partidas dobradas não deve obscurecer o fato de que diferentes formas de documentação contábil, controles e informações foram componentes importantes da civilização romana. Manuais de agricultura, leis, registros de argumentos jurídicos e documentos governamentais evidenciam essa importância.

Richard Vangermeersch para The History of Accounting

O texto discute a existência ou não de partidas dobradas. Há outros elementos interessantes na história de Roma que possuem consequências contábeis, como os aspectos relacionados com as finanças públicas do império.