Somente agora tive conhecimento desse documento. Eis um trecho:
IA e Nossa Relação com Deus
104. A tecnologia oferece ferramentas notáveis para administrar e desenvolver os recursos do mundo. No entanto, em alguns casos, a humanidade está cedendo cada vez mais o controle desses recursos às máquinas. Em certos círculos de cientistas e futuristas, há otimismo quanto ao potencial da inteligência artificial geral (IAG), uma forma hipotética de IA que igualaria ou superaria a inteligência humana e traria avanços inimagináveis. Alguns até especulam que a IAG poderia alcançar capacidades sobre-humanas. Ao mesmo tempo, à medida que a sociedade se afasta de uma conexão com o transcendente, alguns são tentados a recorrer à IA em busca de significado ou realização — anseios que só podem ser verdadeiramente satisfeitos na comunhão com Deus.
105. No entanto, a presunção de substituir Deus por um artefato criado pelo ser humano é idolatria, prática contra a qual as Escrituras alertam explicitamente (por exemplo, Ex. 20:4; 32:1-5; 34:17). Além disso, a IA pode se mostrar ainda mais sedutora do que os ídolos tradicionais, pois, ao contrário dos ídolos que “têm boca e não falam; olhos, e não veem; ouvidos, e não ouvem” (Sl. 115:5-6), a IA pode “falar”, ou pelo menos dar a ilusão de fazê-lo (cf. Ap. 13:15). Contudo, é vital lembrar que a IA é apenas um pálido reflexo da humanidade — ela é criada por mentes humanas, treinada com material gerado por humanos, responde a estímulos humanos e é sustentada pelo trabalho humano. A IA não pode possuir muitas das capacidades específicas da vida humana e também é falível. Ao recorrer à IA como um suposto “Outro” maior que si mesma, com quem compartilhar a existência e as responsabilidades, a humanidade corre o risco de criar um substituto para Deus. Entretanto, não é a IA que acaba sendo deificada e adorada, mas o próprio ser humano — que, assim, torna-se escravo de sua própria obra.
106. Embora a IA tenha potencial para servir à humanidade e contribuir para o bem comum, ela continua sendo uma criação das mãos humanas, trazendo “a marca da arte e do engenho humano” (At. 17:29). Jamais deve ser atribuída a ela um valor indevido. Como afirma o Livro da Sabedoria: “Foi um homem quem os fez, e um ser cujo espírito é emprestado os formou; pois nenhum homem pode formar um deus à sua semelhança. Ele é mortal, e aquilo que fabrica com mãos ímpias é morto; ele é melhor do que os objetos que adora, pois ele tem vida, mas eles jamais têm” (Sb. 15:16-17).
107. Em contraste, os seres humanos, “por sua vida interior, transcendem todo o universo material; experimentam essa profunda interioridade quando entram em seu próprio coração, onde Deus, que sonda o coração, os aguarda, e onde decidem seu próprio destino diante de Deus.”É no coração, como nos recorda o Papa Francisco, que cada indivíduo descobre a “misteriosa conexão entre o autoconhecimento e a abertura aos outros, entre o encontro com a própria singularidade e a disposição de doar-se aos demais.” Portanto, é somente o coração que é “capaz de colocar nossas outras faculdades e paixões, e toda a nossa pessoa, numa atitude de reverência e obediência amorosa diante do Senhor,”que “se oferece para tratar cada um de nós como um ‘Tu’, sempre e para sempre.”
O texto é de janeiro, durante a gestão de Francisco, com mais de 200 citações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário